A Organização Mundial da Saúde (OMS) define o saneamento ambiental como o controle de todos os fatores ambientais que podem exercer efeitos nocivos sobre o bem-estar físico, mental e social das pessoas. Isso inclui a poluição do ar, do solo e das águas, bem como as poluições sonora e visual, além da ocupação desordenada do solo, esgoto a céu aberto, entre outros.
Na prática, o saneamento ambiental é fundamental para a prevenção de doenças e trata-se de uma saúde pública preventiva. Os serviços mais conhecidos e praticados são o fornecimento de água potável e a coleta e o tratamento dos esgotos e dos resíduos sólidos.
No período colonial (1530-1822), ações de saneamento eram feitas de forma individual, resumindo-se à drenagem de terrenos e instalação de chafarizes. O primeiro registro é de 1561, quando Estácio de Sá mandou escavar o primeiro poço para abastecer a cidade do Rio de Janeiro. Já em 1673, deu-se início à construção do primeiro aqueduto do Brasil, que ficou pronto somente em 1723, e, atualmente, é conhecido como os Arcos da Lapa.
No final do século XIX, ocorreu uma organização dos serviços de saneamento e eles passaram a ser prestados por companhias estrangeiras, principalmente inglesas. Só que a qualidade era péssima e, a partir dos anos 1940, se iniciou a comercialização dos serviços em terras nacionais. Surgem, então, as autarquias e mecanismos de financiamento para o abastecimento de água, com influência do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), atual Fundação Nacional de Saúde (FUNASA).
Só que essas medidas não foram suficientes para colocar o saneamento nos eixos. Ao longo dos anos, diferentes fatores dificultaram o progresso do setor no Brasil. Entre os principais obstáculos estão: a falta de planejamento adequado, o pouco investimento, a deficiência na gestão e a baixa qualidade técnica dos projetos. Mas tudo pareceu que ia finalmente ser organizado com a Lei Federal nº 11.445 de 5 de janeiro de 2007, mais conhecida como Marco Regulatório do Saneamento Nacional.
Um dos maiores acertos quando o assunto é saneamento ambiental no Brasil é esta lei criada em 2007. Sancionada pelo então presidente Luiz Inácio “Lula” da Silva, consiste em uma regulamentação para o setor. “Até então não existia o mínimo de organização e metas para o saneamento. Embora não seja perfeita, deu um norte para os prestadores de serviço e conseguiu definir um endereço, um ministério com o qual tratamos diretamente”, diz Rogério de Paula Tavares, vice-presidente de relações institucionais da Aegea Saneamento.
A Lei Federal nº 11.445 estabeleceu e deu encaminhamento a várias questões que, até então, não estavam cobertas pela legislação. Ela definiu diretrizes nacionais para a prestação de serviços de água e esgoto, fixando os direitos e as obrigações da União de manter o setor, estabelecendo regulação, além de inspecionar e planejar políticas. A norma ainda trouxe o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), que tem o objetivo de universalizar os serviços de abastecimento de água e saneamento.
De lá para cá, o saneamento ambiental brasileiro melhorou. Mas as metas estabelecidas não foram totalmente atingidas.
Segundo o Plansab, a universalização dos serviços deveria atingir 100% do território nacional com água potável e tratar 92% dos esgotos até 2033. Porém, este é o real panorama: 45% da população brasileira convive sem tratamento de esgoto e 70% dos 5.570 municípios têm tratamento de esgoto com, no máximo, 30% de eficiência. Em relação à água potável, 34 milhões de pessoas – cerca de 16% da população – não têm acesso ao recurso.
O Brasil tem investido uma média de R$ 9 bilhões por ano no setor, mas seria necessário desembolsar cerca de R$ 20 bilhões anuais para atingir a meta. No ritmo em que o saneamento ambiental está indo, tais objetivos só serão alcançados em 2054 – na melhor das hipóteses.
“A falta de perspectivas no setor deve provocar graves consequências, como a perda de profissionais da área de consultoria no saneamento para outras atividades, enquanto nosso conhecimento tecnológico ficará estagnado e se perderá ao longo do tempo. Enfim, poderemos ver o desmonte no saneamento da engenharia consultiva brasileira, caso mudanças significativas não sejam feitas no curto e médio prazo”, alerta Luiz Pladevall, presidente da Associação Paulista de Empresas de Consultoria e Serviços em Saneamento e Meio Ambiente (APECS).
Para Tavares, uma solução para acelerar o tratamento e até cumprir as metas em tempo seria incentivar uma colaboração entre os serviços público e privado. “De um lado, 94% do saneamento é tratado por prestadores públicos. Do outro, o setor privado tem uma facilidade em acessar o mercado de capitais e não é obrigado a seguir tantas regras e normas para ter projetos aprovados. Se eles trabalhassem com seus maiores benefícios, seria um caminho a se viabilizar e discutir”, comenta o especialista.
O desafio brasileiro para regularizar o saneamento ambiental é do tamanho dos seus 5.570 municípios e das diferenças regionais que possui. É que, enquanto no Sudeste o acesso à água potável chega a 91,24% da população e 48,8% do esgoto é tratado, no Norte os percentuais são de 55,37% e 18,3%, respectivamente. Os dados são do relatório elaborado pelo Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS).
“O bom é que o saneamento é uma atividade de caráter local e tem o município como poder concedente, o que fortalece a importância de planos, planejamento e gestão eficientes”, destaca Álvaro José Menezes da Costa, diretor nacional da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES).
O problema é que os municípios ainda não possuem poder suficiente. Para ter um melhor desempenho, prefeituras, Estados e União precisam caminhar juntos e planejar metas a médio e longo prazo.
“É importante que as cidades estejam preparadas para realizar projetos de saneamento. Algo que não ocorre hoje. A maioria dos municípios brasileiros sequer contam com um profissional de engenharia, o que dificulta – e muito – a realização até de uma licitação para a contratação de serviços. O Governo Federal, no futuro, deve investir na capacitação dessas cidades. Em alguns casos, o dinheiro até existe, mas os projetos não conseguem sair do papel”, conta Pladevall.
O Mercosul pode contribuir diretamente na melhoria dos serviços de saneamento ambiental oferecidos às populações de seus países-membros. Isso porque eles podem se beneficiar do intercâmbio de produtos e tecnologia. Um dos exemplos é o fato de que Uruguai e Paraguai não produzem canos e precisam importá-los do Brasil e da Argentina.
Em relação aos investimentos em abastecimento de água potável, o Paraguai é o único integrante do bloco comercial no qual abastecimento de água é inferior a 80%. Ele apresenta 77%. Na Argentina, esse índice é de 86%, e no Uruguai, 100%. Já no que diz respeito à coleta dos esgotos, o indicador do Uruguai é de 96%, enquanto na Argentina é de 97% e no Paraguai esse dado cai para 70%. As informações foram tiradas dos sites oficiais de cada país.
“Os países do Mercosul têm empreendido esforços para ampliar os serviços de abastecimento de água e saneamento, conforme estabelecem os Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODMs), que são as metas estabelecidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2000. Cada nação tem respondido às questões do setor de acordo com suas realidades próprias”, comenta Pladevall. “Hoje, a troca de experiências vem se tornando mais frequente, garantindo que alguns países conheçam os programas de sucesso, permitindo aproveitar na sua realidade os caminhos para o avanço do setor”, completa.
A troca de experiência entre os países-membro deve, sim, se intensificar nos próximos anos. O que vai proporcionar um fortalecimento do bloco e da economia dos integrantes. Vale ficar de olho para ver as novidades do Brasil.